Os conflitos na Síria agravaram-se nesta semana com a chegada de forças rebeldes à capital Damasco e a morte de autoridades do primeiro escalão do governo. Quase um ano e meio após o início das manifestações pró-democracia, mais de 10 mil pessoas já morreram em confrontos que a Cruz Vermelha classifica agora como guerra civil.
A ONU tenta negociar uma saída diplomática para a crise. Porém, todas as propostas de sanções para forçar a renúncia do presidente Bashar Al Assad foram emperradas pela Rússia, que tem poder de veto no Conselho de Segurança.
Os protestos na Síria começaram em 15 de março de 2011, na sequência de revoltas conhecidas como Primavera Árabe, que derrubaram ditadores na Tunísia e no Egito. Na época, os sírios manifestaram-se contra a prisão e tortura de estudantes que grafitaram um muro com críticas ao regime de Al Assad.
A repressão do Exército só aumentou a revolta da população. O governo fez algumas concessões, como o fim do estado de emergência, que vigorava há 48 anos, e a aprovação de uma nova constituição. Mas os manifestantes, que no começo pediam democracia, passaram a exigir a renúncia do presidente, há 11 anos no poder.
A oposição ao regime organizou-se em duas frentes principais: o Conselho Nacional Sírio (CNS), ligado ao fundamentalismo islâmico, e o Exército Livre da Síria (ELS), braço armado composto por militares desertores.
O Exército passou a usar artilharia pesada contra o povo, promovendo massacres. Em maio, mais de 100 pessoas foram mortas na cidade de Houla, a maioria mulheres e crianças. Na semana passada, outras 200 morreram em um ataque militar à aldeia de Tremseh.
A ONU estima em mais de 10 mil o número de mortos, enquanto ativistas de direitos humanos calculam 17 mil.
No dia 15 de julho, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha declarou que o país se encontra em guerra civil. Com isso, passa a valer a Convenção de Genebra, tratado que garante a proteção dos civis e possibilita a abertura de processos por crimes contra a humanidade.
No dia 18, um atentado em Damasco matou o ministro da Defesa e outros dois generais que compunham a cúpula de segurança do ditador (um deles cunhado de Al Assad). O ataque, reivindicado pelo ELS, causou as primeiras mortes de autoridades do regime.
Diferenças étnicas
O que torna a crise na Síria mais difícil, em relação aos outros países afetados pela Primavera Árabe, são as diferenças étnicas e religiosas. A população de 23 milhões de habitantes divide-se em uma maioria sunita (74%) e minorias alauítas (12%), cristãos ortodoxos (10%) e drusos (3%).
Durante séculos, os sunitas formaram a elite política, econômica e militar do país. Em 1960, contudo, golpes de Estado colocaram os alauítas no poder. Em 1971, o alauíta Hafez Assad, pai do atual líder sírio, assumiu a Presidência e permaneceu no cargo por 30 anos.
Nesse período, Assad concedeu privilégios às demais minorias étnicas do país – cristãos e drusos –, gerando descontentamento entre os sunitas. No começo dos anos 1980, a ditadura reprimiu de forma violenta protestos organizados pela Irmandade Muçulmana. Temendo novas revoltas, o governo aparelhou as Forças Armadas e o serviço secreto, que hoje reprimem os rebeldes.
O medo de um massacre étnico também explica o porquê do presidente Al Assad se recusar a deixar a Presidência.
Rússia
A situação geopolítica da Síria é outro fator que dificulta uma solução para o caos nas ruas de Damasco. Por que não há uma ofensiva militar como ocorreu, por exemplo, na Líbia, que depôs o líder Muammar Gaddafi em agosto do ano passado?
A Síria, aliada do Irã, é uma das poucas nações árabes que se opõem aos interesses dos Estados Unidos e de Israel no Oriente Médio. Uma intervenção direta de Washington traria mais instabilidade política à região, já conturbada por guerras entre israelenses e palestinos.
Pelo mesmo motivo, o Conselho de Segurança da ONU não consegue aprovar resoluções mais duras contra Al Assad.
A Rússia tem recusado qualquer plano de afastamento do ditador sírio. Não somente por interesses comerciais (contratos bilionários de venda de armamentos à Síria), mas também políticos.
De um lado, países como Estados Unidos, França e Reino Unido querem forçar o governo sírio a aceitar uma proposta de cessar-fogo e a renúncia de Al Assad, que teria como consequência o isolamento do Irã. Do outro, China e Rússia querem manter o presidente, alegando que as razões humanitárias são um pretexto para a hegemonia ocidental no mundo muçulmano.
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