sábado, 29 de outubro de 2016

O que é bolivarianismo?

A palavra da moda no Brasil é usada por muita gente que não faz ideia de seu significado. Entenda o que é bolivarianismo e por que ele nada tem a ver com "ditadura comunista"


Após ser apropriado pelo ex-presidente venezuelano Hugo Chávez, o termooriginado do sobrenome do libertador Simón Bolívar aterrissou no debate político brasileiro. São frequentes as acusações de políticos de oposição e da mídia contra o governo federal petista. Lula e Dilma estariam "transformando o Brasil em uma Venezuela". Mas o que é o tal bolivarianismo de que tanto falam? É um palavrão? O Brasil é uma Venezuela? Bolivarismo é sinônimo de ditadura comunista? Antes de sair por aí repetindo definições equivocadas, leia as respostas abaixo:
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Simón Bolivar
O que é bolivarianismo?
O termo provém do nome do general venezuelano do século 19 Simón Bolívar, que liderou os movimentos de independência da Venezuela, da Colômbia, do Equador, do Peru e da Bolívia. Convencionou-se, no entanto, chamar de bolivarianos os governos de esquerda na América Latina que questionam o neoliberalismo e o Consenso de Washington (doutrina macroeconômica ditada por economistas do FMI e do Banco Mundial).

Bolivarianismo e ditadura comunista são a mesma coisa?
Não. Mesmo considerando a interpretação que Chávez deu ao termo, o que convencionou-se chamar bolivarianismo está muito longe de ser uma ditadura comunista. As realidades de países que se dizem bolivarianos, como Venezuela, Bolívia e Equador, são bem diferentes da Rússia sob o comando de Stalin ou mesmo da Romênia sob o regime de Nicolau Ceausescu. Neles, os meios de produção estavam nas mãos do Estado, não havia liberdade política ou pluralidade partidária e era inaceitável pensar diferentemente da ideologia dominante do governo. Aqueles que o faziam eram punidos ou exilados, como os que eram enviados para o gulag soviético, campo de trabalho forçado símbolo da repressão ditatorial da Rússia. Na Venezuela, por exemplo, nada disso acontece. A oposição tem figuras conhecidas como Henrique Capriles, Leopoldo López e Maria Corina Machado. Cenário semelhante ocorre na Bolívia, no Equador e também no Brasil, onde há total liberdade de expressão, de imprensa e de oposição ao governo.

Foi Chávez quem inventou o bolivarianismo?
Não. O que o então presidente venezuelano Hugo Chávez fez foi declarar seu país uma "república bolivariana". A mesma retórica foi utilizada pelos presidentes Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia). A associação entre bolivarianismo e socialismo, no entanto, é questionável segundo a própria biógrafa de Bolívar, a jornalista peruana Marie Arana, editora literária do jornal americano The Washington Post. De acordo com ela, esse “bolivarianismo” instituído por Chávez na Venezuela foi inspirado nos ideais de Bolívar, tais como o combate a injustiças e a defesa do esclarecimento popular e da liberdade. Mas, segundo a biógrafa, a apropriação de seu nome por Chávez e outros mandatários latinos é inapropriada e errada historicamente: “Ele não era socialista de forma alguma. Em certos momentos, foi um ditador de direita”.

O que se tornou o bolivarianismo na Venezuela?
Quando assumiu a Presidência da República em 1999, Chávez declarou-se seguidor das ideias de Bolívar. Em seu governo uma assembleia alterou a Constituição da Venezuela de 1961 para a chamada Constituição Bolivariana de 1999. O nome do país também mudou: era Estado Venezuelano e tornou-se República Bolivariana da Venezuela. Foram criadas ainda instituições de ensino com o adjetivo, como as escolas bolivarianas e a Universidade Bolivariana da Venezuela.

Mas esse regime que Chávez chamava de bolivarianismo era comunista?
Não, apesar de o ex-presidente venezuelano ter usado o termo "Revolução Bolivariana" para referir-se ao seu governo. A ideia era promover mudanças políticas, econômicas e sociais como a universalização à educação e à saúde, além de medidas de caráter econômico, como a nacionalização de indústrias ou serviços. Chávez falava em"socialismo do século XXI", mas o governo venezuelano continua permitindo a entrada de capital estrangeiro no País, assim como a parceria com empresas privadas nacionais e estrangeiras. Empreiteiras brasileiras, chinesas e bielo-russas, por exemplo, constroem moradias para o maior programa habitacional do país, o Gran Misión Vivienda Venezuela, inspirado no brasileiro Minha Casa Minha Vida.

O Brasil "virou uma Venezuela"?
Esta afirmação não faz sentido. O Brasil é parceiro econômico e estratégico da Venezuela, mas as diretrizes do governo Dilma e do governo de Nicolás Maduro são bastante distintas, tanto na retórica quanto na prática.

Os conselhos populares são bolivarianos?
Não, e aqui o engano vai além do uso equivocado do adjetivo. Parte da Política Nacional de Participação Social, os conselhos populares seriam a base de um complexo sistema de participação social, com a finalidade de aprofundar o debate sobre políticas públicas com representantes da sociedade civil. Ao contrário do alegado por opositores, os conselhos de participação popular não são uma afronta à democracia representativa. Conforme observou o ex-ministro e fundador do PSDB Luiz Carlos Bresser-Pereira, os conselhos estabeleceriam “um mecanismo mais formal por meio do qual o governo poderá ouvir melhor as demandas e propostas [da população]”.

http://www.cartacapital.com.br/politica/o-que-e-bolivarianismo-2305.html

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

ACORDO NUCLEAR ENTRE IRÃ E OCIDENTE

Irã se prepara para receber capital e tecnologia estrangeiros

Jan 2016

Presidente Rohani felicita a nação por acordo com o Ocidente e busca tranquilizar os rivais regionais

HISTÓRICO NO FINAL DO POST

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O presidente do Irã Hasan Rohani, descreveu neste domingo o  acordo nuclear com o Ocidente como uma “vitória política” do seu país. Em tom triunfal, na primeira reação após a suspensão das sanções internacionais, o mandatário declarou ao Parlamento que o acordo “abre um novo capítulo” na história do país e marca um momento decisivo para a economia. Em uma declaração posterior, transmitida pela televisão, Rohani admitiu que Teerã precisará atrair pelo menos 30 bilhões de dólares (121,4 bilhões de reais) em investimentos estrangeiros diretos nos próximos cinco anos.
“A partir de hoje as empresas podem voltar a utilizar os canais legais para fazer negócios, os bancos iranianos voltarão a operar com normalidade, foram suspensos os limites à exportação de petróleo e podemos comprar peças de reposição para a aviação, o que aumentará a segurança dos nossos passageiros; além disso, recuperaremos o dinheiro que, com o pretexto das sanções, havia sido congelado em instituições bancárias estrangeiras”, enumerou Rohani, visivelmente satisfeito.
Em várias ocasiões, ele insistiu que o acordo foi resultado da “resistência, sabedoria e vontade nacional” dos iranianos, além de destacar “a orientação do líder supremo”, o aiatolá Ali Khamenei, e o trabalho de diplomatas experientes. Ele tinha à sua frente a cúpula do seu Governo, incluindo o ministro de Relações Exteriores, Mohammad Javad Zarif, e seu braço-direito nas negociações, o vice-ministro Abbas Araqchi. “Quem não acreditou que poderíamos conseguir se equivocou; conseguimos, graças ao poder da nossa nação”, declarou ele, sob aplausos.
Mas, deixando-se de lado o tom épico das suas palavras e as obrigatórias referências aos “mártires da causa nuclear” (estavam presentes as viúvas dos cinco cientistas assassinados durante o período de expansão do programa atômico), a mensagem foi sobretudo econômica. Questionado por um jornalista a respeito das estimativas de que o Irã precisaria de 30 a 50 bilhões de dólares em investimentos estrangeiros nos próximos cinco anos, o presidente aceitou a cifra.
“Necessitamos de capital e tecnologia. Nosso país é suficientemente estável para atrair os investidores estrangeiros e está preparado para recebê-los”, afirmou, mencionando também que representantes de 140 empresas de 50 países já visitaram o Irã para avaliar possíveis investimentos. Trata-se, segundo ele, de uma questão de confiança. “Nas poucas horas transcorridas desde anúncio, foram expedidas mais de mil cartas de crédito [compromissos de investimento] em diferentes bancos estrangeiros”, anunciou. Outro repórter quis saber se o Irã aceitará também investimentos dos EUA. Rohani constatou que são as leis norte-americanas que impedem os cidadãos desse país de negociarem com o Irã (exceto em alguns setores específicos). “Se eles chegarem, estaremos dispostos a recebê-los”, acrescentou, em tom sóbrio.
Esse pragmatismo – ou moderação, segundo alguns analistas – impulsionou a aposta de Rohani na negociação nuclear assim que ele tomou posse, em meados de 2013. É verdade que depois se soube que os contatos preliminares haviam começado ainda antes. Entretanto, é duvidoso que, com outro presidente menos aberto ao diálogo, fosse possível levar o acordo adiante. Obtê-lo exigiu não só a habilidade diplomática de Rohani como também um jogo de cintura político para suportar a resistência dos setores mais conservadores (que desconfiam do Ocidente e especialmente dos EUA) e daqueles que se beneficiavam de uma economia fechada ao exterior.
O resultado positivo da sua perseverança surge, além disso, num momento crítico, já que o Irã realiza uma importante eleição legislativa no fim deste mês. Como lhe recordou uma jornalista, há intensos rumores de que seus adversários políticos tentarão desqualificar a candidatura de aliados do presidente. Rohani disse estar a par disso, mas se mostrou confiante de que a lei será cumprida. Ele acredita que os iranianos, recuperada a esperança após anos de penúrias, estarão ao seu lado. Por isso quer que estes vejam logo os benefícios do acordo.
“A partir de hoje começamos a vender mais petróleo”, anunciou ele na entrevista coletiva. “Agora precisamos aumentar as exportações não petroleiras para criar um ambiente competitivo”. Seu objetivo, afirmou, é dar mais peso ao setor privado, e que o petróleo proporcione “uma renda suplementar”. “Com o fim das sanções, chegou a hora de construir o país”, declarou pela manhã no Parlamento.
“Os investidores não deveriam olhar para o Irã a fim de ganhar dinheiro rápido, e sim investir com uma visão de longo prazo para se beneficiarem do mercado que terá o melhor rendimento nos próximos cinco anos”, aconselha Ramin Rabii, executivo-chefe da consultoria financeira Turquoise Partners. “Esperamos que a economia iraniana cresça a um ritmo de 6% a 8% durante vários anos”, declarou Rabii à Bloomberg. Rohani foi mais precavido e disse que esperava “pelo menos 5% no próximo ano” fiscal (que começa em 21 de março).

Protesto de Israel

A suspensão de sanções parece contentar a muitos, mas certamente não a Israel. O governo do primeiro-ministro Benjamim Netanyahu continua convencido de que o Irã não abandonou suas aspirações nucleares. “A política israelense foi e continuará sendo a mesma: não permitir que o Irã obtenha armas nucleares", afirmou Netanyahu neste domingo numa reunião do gabinete de Governo, informa Lourdes Baeza, de Jerusalém.
Israel espera que, se houver alguma violação do acordo, “a comunidade internacional se encarregará de tomar medidas mais contundentes e sanções mas duras”. Para isso, Netanyahu assegurou que os israelenses “vigiarão rigidamente” as atividades iranianas, porque ele está convencido de que o acordo só servirá para que o Irã “tenha mas meios para propagar suas atividades terroristas”.


PROGRAMA NUCLEAR IRANIANO
Início O início do programa nuclear iraniano ocorreu em 1970, ainda durante o regime do xá. Naquela época, a iniciativa tinha apoio dos EUA e da Europa. Depois veio a Revolução Islâmica e em 1982 , o governo iniciou a criação, em Isfahan, de um centro de tecnologia nuclear. Três anos depois, foram descobertas minas de urânio em seu território.

Motivos para o programa O irã justifica as pesquisas na área pela necessidade de diversificar as fontes de energia. O país tem grandes reservas de gás e petróleo, do que é um dos maiores exportadores mundiais, mas sua capacidade de refino é pequena. Por isso, importa 40% do combustível que consome. Os EUA e os países europeus, porém, contestam essa explicação, com o argumento de que o Irã possui muito petróleo e que não precisariam de energia nuclear.Resultado de imagem para programa nuclear iraniano 2016
Sanções ao país Nos últimos anos, a questão nuclear tornou-se um elemento de afirmação nacional do Irã. A negativa do país em paralisar o programa nuclear já havia levado a Organização das Nações Unidas (ONU) a aprovar três pacotes de sanções com o país – em dezembro de 2006, em março de 2007 e em março de 2008. Após as primeiras sanções, o Irã não permitiu mais visitas de técnicos da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) a locais não vinculados a atividades atômicas.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Educação - Docência: uma carreira desprestigiada


Levantamento realizado pela Fundação Victor Civita comprova uma percepção alarmante: a profissão docente não é considerada uma opção atraente pelos estudantes do Ensino Médio. Apenas 2% desejam cursar Pedagogia ou Licenciatura

por: Rodrigo Ratier

"Se você comentar com alguém que está pensando em ser professor, muitas vezes a pessoa pode dizer algo do tipo: 'Que pena' ou 'Meus pêsames!'. Afinal, sabe que você vai ser desvalorizado e obter uma remuneração ruim." É com essa chocante clareza que Thaís*, aluna do 3º ano do Ensino Médio de uma escola particular em Manaus, sintetiza uma noção preocupante para a Educação brasileira: cada vez menos jovens desejam seguir a carreira docente. 

Embora essa impressão tenha se espalhado até mesmo entre quem não é da área, faltava dimensionar com contornos mais nítidos a extensão do problema. A área deEstudos e Pesquisas da Fundação Victor Civita (FVC) encomendou à Fundação Carlos Chagas (FCC) um mergulho no tema e os dados comprovam: apenas 2% dos estudantes que estão concluindo o Ensino Médio têm como primeira opção no vestibular graduações diretamente relacionadas à atuação em sala de aula - Pedagogia ou alguma Licenciatura. Outros 9% mencionam a intenção de cursar disciplinas da Educação Básica, como Letras, História e Matemática, o que não garante que venham a se interessar por lecionar (confira mais detalhes no gráfico da página 3).
* Ao longo deste especial, os nomes dos alunos ouvidos pela pesquisa foram trocados para preservar a confidencialidade do estudo. 
Os jovens que aparecem nos depoimentos em destaque são identificados normalmente, pois foram entrevistados pela equipe de NOVA ESCOLA.

A pesquisa ouviu 1.501 alunos de 18 escolas públicas e privadas

Patrocinado pela Abril Educação, o Instituto Unibanco e o Itaú BBA, o estudoAtratividade da Carreira Docente no Brasil é mais uma iniciativa da FVC para contribuir para a melhoria da qualidade da Educação Básica. A pesquisa ouviu 1.501 alunos de 3º ano em 18 escolas públicas e privadas de oito municípios, selecionados por seu tamanho, abrangência regional, densidade de alunos no Ensino Médio e oportunidades de emprego. Foram contempladas as cinco regiões do país. No Sul, as cidades escolhidas foram Joinville e Curitiba; no Sudeste, São Paulo e Taubaté; no Centro-Oeste, Campo Grande; no Nordeste, Fortaleza e Feira de Santana; no Norte, Manaus. 

Para entender melhor as respostas fornecidas pelos estudantes no questionário geral, o estudo contou ainda com uma fase de grupos de discussão, em que dez alunos de cada escola debateram o assunto e detalharam opiniões. Por fim, com as informações já compiladas, um painel de especialistas foi convidado a avaliar os resultados e propor soluções sobre o problema da atratividade docente. 

Na edição especial de NOVA ESCOLA traz os principais resultados da sondagem. Ao longo das reportagens, você vai conhecer em detalhes o que os jovens estudantes brasileiros pensam da docência como uma opção profissional. Em linhas gerais, apesar de reconhecerem a importância do professor, os entrevistados afirmam que a profissão é desvalorizada socialmente, mal remunerada e possui uma rotina desgastante e desmotivadora. Para a grande maioria, não é uma carreira interessante a seguir (leia mais no texto Por que a docência não atrai).

Perfil dos futuros professores e possibilidades de mudança

A pesquisa também permite construir um perfil dos futuros professores do país. Nesse sentido, é útil analisar a lista das carreiras mais procuradas de acordo com o tipo de instituição em que os jovens estudam. Nas escolas públicas, a Pedagogia aparece no 16º lugar das preferências. Nas particulares, apenas no 36º. A situação se repete também com as Licenciaturas - que, somadas, ocupam o 24º posto na rede pública e o 37º na particular (como mostra o gráfico abaixo). "Isso evidencia que, atualmente, a profissão tende a ser procurada sobretudo por jovens da rede pública de ensino, que em geral pertencem a nichos sociais menos favorecidos", afirma Bernardete Gatti, pesquisadora da FCC e supervisora do estudo (leia mais na reportagem Nossos futuros professores). 

Depois de obter um diagnóstico completo, o estudo deu ênfase à proposição de alternativas para reverter a situação. Para apontar soluções, a FVC e a FCC convidaram 17 especialistas de diversas áreas da Educação para um debate em novembro do ano passado. O consenso é o de que se deve atacar o problema por diversas frentes, do aumento salarial à melhoria das condições de trabalho, da proposição de planos de carreira à revisão das formações inicial e continuada, passando pela necessidade de valorizar o professor e tratá-lo como profissional (leia mais na reportagem Caminhos para atrair os melhores). 

Ao todo, são oito sugestões práticas, que podem ajudar a desatar o nó identificado por outra jovem do Ensino Médio, Cláudia*, aluna de escola pública em Feira de Santana, a 119 quilômetros de Salvador: "Hoje em dia, quase ninguém sonha em ser professor. Nossos pais não querem que sejamos professores, mas querem que existam bons professores. Assim, fica difícil".


quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Acordo histórico: Colômbia e Farc assinam cessar-fogo

Uma nova era se inaugura na Colômbia. Em cerimônia na cidade de Havana, capital de Cuba, o presidente colombiano Juan Manuel Santos e o líder do grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Rodrigo Londoño Echeverri, assinaram em junho um acordo de cessar-fogo definitivo, abrindo caminho para um tratado de paz que dê fim ao conflito armado mais antigo da América Latina.
Desde 1964 o conflito já matou mais de 220 mil pessoas e causou o deslocamento de seis milhões de colombianos. Ao longo dos anos, as Farc se tornaram uma organização coesa, presente em mais da metade do território da Colômbia e que chegou a ter 20 mil combatentes. As autoridades estimam que hoje existam oito mil guerrilheiros.
O acordo é o mais sólido já alcançado entre as partes, pois foi a primeira vez que desde meados da década de 1980 que ambos concordam com uma trégua bilateral. Os bastidores desse processo de paz revelam uma intensa negociação.
Desde novembro de 2012 representantes do governo colombiano e das Farc se encontram em Havana para costurar o acordo de paz. Cuba e Noruega atuam como países mediadores desse diálogo e também contam com o apoio da Venezuela e do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon como observadores internacionais.
A etapa do cessar-fogo bilateral definitivo prevê o cumprimento de um cronograma para tratar diversos temas espinhosos para o fim do conflito, como o desarmamento, a reintegração à vida civil, a reparação para as vítimas das guerrilhas e garantias de segurança para os ex-guerrilheiros das Farc.
Com esse acordo, mais de sete mil guerrilheiros devem entregar as armas. Parte do arsenal de fuzis deve ser derretido para que a Organização das Nações Unidas possa criar três monumentos em homenagem à paz.

Origem das Farc

A história política da Colômbia é marcada por conflitos. Entre os anos de 1948 e 1958, os dois partidos tradicionais da República Colombiana protagonizaram um período conhecido como “A Violência”, marcado por confrontos armados. Nesse contexto, surgiram diversos grupos guerrilheiros de “autodefesa”, de inúmeras orientações políticas e ligados a diferentes partidos.
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A origem das Farc é em um pequeno foco de resistência camponesa comunista. Em 1964, o movimento fez uma tentativa de fundar uma zona autônoma marxista e proclamou a criação da República de Marquetalia, que foi posteriormente atacada pelo Exército. A resposta a esse ataque foi a criação de diversos focos de guerrilha, que, unidos, se tornaram as Farc. Esses grupos montaram uma estrutura militar, com acampamentos em selvas e nas montanhas colombianas.
Inspirados pelo êxito da Revolução Cubana, o projeto político do grupo era pautado pela reforma agrária e a criação de um Estado socialista. Para isso, buscaram combater o governo. Uma das principais formas de financiamento do grupo era a cobrança do “imposto revolucionário”, uma taxa imposta à população local.
A partir dos anos 1980, os guerrilheiros também começaram a atuar no tráfico de drogas, na mineração ilegal e na indústria dos sequestros para financiar suas atividades. Em seus anos de maior atuação, as Farc praticaram sequestros, ataques e assassinatos. Por esses crimes, a organização integra a lista internacional de organizações terroristas. Apesar dos indícios, as Farc negam todas as acusações de envolvimento com o narcotráfico.
O poder das Farc na Colômbia contribuiu para o surgimento de grupos paramilitares de extrema direita, financiados por grandes fazendeiros e empresários. Muitos são contratados para assassinar guerrilheiros clandestinos e líderes de movimentos sociais. Atualmente, grupos paramilitares tentam controlar as zonas produtoras de coca e o comércio das drogas. 

O que há no processo de paz?

Durante as últimas décadas, várias foram as tentativas de negociação frustradas entre o governo colombiano e a guerrilha. A negociação entre as duas partes se dá com base em cinco eixos principais: situação das vítimas, minas armadilhas e explosivos, tráfico de drogas, entrada na vida política e reforma agrária.
Pesquisas de opinião mostram que a população colombiana anseia por colocar o fim à guerra, mas tem dúvidas sobre diversos pontos do acordo. Hoje, 70% da população apoiam as negociações para a paz. Apesar disso, 80% dos colombianos se opõem à proposta de anistia aos guerrilheiros, e 77% rejeitam a possibilidade de ex-combatentes se lançando como candidatos em futuras eleições.

• Participação política

A ideia é que as Farc se tornem um partido político. Agora, o acordo prevê o estabelecimento de garantias legais e segurança para o surgimento de forças políticas de oposição.

• Reforma agrária

A reforma agrária é uma das principais reinvidicações políticas das Farc. Se prosperar, a negociação lançará bases para uma aposta robusta do governo no modelo de produção agrícola familiar nas regiões mais afetadas pelo conflito.

• Reparação das vítimas

Em dezembro de 2015, as partes anunciaram um dos acordos mais complexos da negociação que busca reparar as vítimas e sancionar os responsáveis de delitos graves. Como parte desse acordo, serão formados tribunais especiais que julgarão os guerrilheiros e agentes do Estado envolvidos em crimes relacionados com o conflito. Os principais responsáveis por crimes hediondos deverão ser julgados e punidos.

• Minas e explosivos

Mesmo se a guerra acabar, a Colômbia terá de conviver com o perigo de minas enterradas em diversas regiões. Será preciso identificar os locais infestados e realizar a descontaminação. Essas operações serão realizadas por militares e deverão durar anos.

• Tráfico de Drogas

Desde a década de 1980, o narcotráfico alimenta e agrava o conflito. Em maio de 2014, as Farc chegaram a um acordo com o governo para a substituição de cultivos ilegais de coca em áreas de influência. Segundo o governo dos Estados Unidos, as Farc controlam cerca de 70% do território onde se cultiva a coca na Colômbia.

PARA SABER MAIS

As Farc - Uma guerrilha sem fins?, de Daniel Pécaut
Editora Paz e Terra (2010)
Por Carolina Cunha
Outra reportagem interessante sobre o tema: A vida de guerrilheiros das FARC após depor as armas  http://brasil.elpais.com/brasil/2016/09/02/internacional/1472809475_728055.html?rel=mas

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Tá tudo bem, vem cá. (Texto muito bom)

Esses dias, enquanto dirigia, eu ouvia uma música bem bobinha da Pitty, que eu adoro. Logo em seguida, o flow colocou Queen, que eu adoro. Mais duas músicas depois, Caetano. Depois, Novos Baianos, depois Led Zeppelin, Rolling Stones – para, enfim, eu trocar para rádio e estar tocando roupa nova. E eu cantei interpretando. Ri de mim mesma, na adolescência, eu jamais admitiria que amo pagode anos 90, que Fundo de Quintal e Raça Negra me fazem sair da cadeira e que estendi esse chamego até os 2000 e bolinha junto com Inimigos da Hp. Jamais a gótica que eu fui admitiria que, sim, ela amava (amo ainda) AC/DC, mas que também se sacudia com Zeca Pagodinho. Adolescente tem dessas.
E eles continuarão tendo, mas a gente – que é adulto e tão ou mais perdido – tem que avisar que tá tudo bem.
Tá tudo bem gostar de Megadeth e Sandy e Júnior. Gosto musical não é pílula do matrix, pode escolher os dois.
Tá tudo bem ser amiga do fulano e do beltrano, essa coisa de que a gente tem que criar inimigos é lendinha.
Tá tudo bem ser cristã, sabe? Não, não é verdade que o ateísmo é a marca da ciência e da inteligência suprema. Idiota é que não sabe dar espaço para a religião do outro. Aliás, tá tudo bem ser cristã e feminista; cristã/cristão e homossexual; cristão e curtir ir para festa. É claro que você pode optar seguir quaisquer dogmas, mas tá tudo bem se você optar só seguir seu coração e seu senso de justiça e bondade.
Tá tudo bem gostar de exatas e de humanas, essa separação só serve mesmo para fazer piada. Levá-la a sério demais põe em risco o que você tem de mais bonito: a chance de aprender um pouco de tudo.
Tá tudo bem se você não sabe do que você gosta, e pode ser em termos de roupa, de sexualidade, de profissão. É absolutamente normal. A diferença é que adulto não tem que prestar contas só para mãe e pai; a gente presta para uma sociedade inteira, e, às vezes, é mais fácil a gente fingir que sabe o que está fazendo só pra ninguém encher muito o nosso saco.
Tá tudo bem se sua mãe e seu pai não forem heroicos e invencíveis. Dói admitir que eles são só humanos e erram, mas com o tempo você vai parar de ver isso como defeito e tristeza, e vai ver como a possibilidade de que a vida é aprendizado mesmo, e tá tudo tá dando certo, então.
Tá tudo bem se você não quer ir na escola hoje, se tem preguiça da vida, se acha que ninguém gosta de você. Tá tudo bem ACHAR isso, mas não pare sua vida, ok? Eventualmente, a sensação passa e você perdeu matéria, diversão e boas amizades dando vazão para um sentimento que nem é tão certo.
Tá tudo bem se você gostar de Romero Britto, Pequeno Príncipe e camiseta amarela. Não me leve tão a sério, é tudo um jeito de te fazer sorrir.
Tá tudo bem se você não tem certeza do curso que presta. Essa dúvida sempre existe. Até as pessoas mais confiantes (eu, tá bem? euzinha) se questionam sobre sua profissão, sobre sua própria capacidade, sobre se de fato tem talento.
Tá tudo bem, aliás, nem ter talento pra nada: a gente não é smurf para nascer com habilidade pronta.
Tá tudo bem se tiver tudo ruim, faz parte da vida e é possível que passe. Só não tá tudo bem se alguém está se machucando com a sua conduta, especialmente se esse alguém for você mesmo. Não se maltrate demais, não se cobre mais do que a vida já cobra. Eu tô aqui, vem cá. Dá um abracinho.
miró

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Lixo: transformando chorume em água potável

Uma tecnologia criada no Espírito Santo vem ajudando um aterro sanitário a transformar chorume - líquido que resulta da decomposição de lixo - em água limpa, no município de Cariacica, na Grande Vitória. De acordo com os responsáveis pelo projeto, o processo de purificação do líquido é rápido se comparado a outros, durando cerca de 30 minutos. Com a utilização de  métodos diferentes, esse tempo pode ser ampliado consideravelmente, chegando a uma semana. A água limpa que é resultado do processo não serve para consumo humano, mas pode ser usada para lavara estradas ou regar jardins, por exemplo.
De acordo com o empresário Poy Ramos, o tratamento deste produto é importante para garantir a preservação do meio ambiente, que pode ser prejudicado caso o chorume seja derramado. "Pode contaminar o lençol freático, de onde vem praticamente toda a água utilizada para consumo humano, bem como contaminar os rios, provocando a mortandade dos peixes e de outros seres vivos que ali vivem", explicou.
O processo começa com a chegada do lixo ao aterro, que recebe mensalmente uma média de 12 mil toneladas de resíduos por dia provenientes de Vitória, Cariacica, Viana, Serra e outros municípios do estado. A princípio, a carga é pesada e lavada para uma outra área. "A partir de três ou quatro horas depois do recebimento, dependendo se é dia de sol ou de chuva, o resíduo já pode liberar chorume", disse o engenheiro químico, Magmir Soares. Por dia, esse total de materiais descartados geram cerca de 135 mil litros de chorume.
Para poder recolher o produto, é preciso de um sistema de engenharia. Em um primeiro momento, é realizada uma escavação seguida pela compactação da terra. Depois, uma manta hipermeável é colocada no local e, sobre ela, o lixo é despejado. Com a utilização de uma tubulação, o chorume é drenado e conduzido até tanques.

Lá, ele recebe três produtos químicos e é levado para outro tanque, onde passa por um processo eletromagnético. "Placas de ferro são mergulhadas, por onde é transmitida uma corrente elétrica que provoca a dissociação das moléculas, fazendo com que todos os contaminadores do chorume possam ser retirados. Depois que a corrente elétrica atravessa o chorume, 5% dele viram lodo e os 95% são água que pode ser reutilizada", esclareceu o empresário Poy.
Por dia, aterro sanitário gera cerca de 135 mil litros de chorume (Foto: Reprodução/TV Gazeta)
A água que fica ainda passa por três filtros até ficar limpa. Depois de tratada, o líquido fica livre de contaminação e pode ser utilizada para diversos fins, como molhar estradas de chão, regar jardins e regar maquinários. "Pode ser usada para contato primário com o ser humano. Só não está boa para beber ou tomar banho, por exemplo", concluiu Poy Ramos.
* Com colaboração de César Fernandes, da TV Gazeta
fonte: http://g1.globo.com/espirito-santo/noticia/2014/10/tecnologia-criada-no-es-transforma-chorume-em-agua-limpa.html

quarta-feira, 6 de julho de 2016

AUMENTO DO PREÇO DO FEIJÃO E O AGRONEGÓCIO

Li este texto na Caros Amigos.  
Por Alan Tygel
Do Brasil De Fato



O golpe ruralista e o preço do feijão







O que estranhamente não saiu em lugar nenhum foi um elemento muito simples: o agronegócio brasileiro não se preocupa em produzir alimentos para o Brasil. E isso fica muito claro quando olhamos a mudança na utilização das terras no país. Nos últimos 25 anos, houve uma diminuição profunda na área destinada à plantação dos alimentos básicos do nosso cardápio. A área de produção de arroz reduziu 44% (quase metade a menos), e a mandioca recuou 20%.
A área plantada com feijão, o vilão do momento, diminuiu 36% desde 1990, enquanto a população aumentou 41%. Apesar de ter havido um aumento na produtividade, a diminuição da área deixa a colheita mais vulnerável e suscetível a variações como estamos vendo agora.
E o agronegócio?
Os grandes latifundiários do Brasil, aliados aos políticos da bancada ruralista, à multinacionais de agrotóxicos e sementes como Bayer, Monsanto e Basf, e às empresas que dominam a comunicação no país não estão preocupadas com a alimentação da população. Este atores compõem o chamado agronegócio, que domina a produção agrícola no Brasil, e vê o campo apenas como local para aumentar suas riquezas.
Isso significa, na prática, produzir soja e milho para alimentar gado na Europa e na China, enquanto precisamos recorrer à importação de arroz, feijão e até do próprio milho para as festas de São João. Exportamos milho, e agora precisamos importar o milho. Faz sentido?
No mesmo período em que a área plantada de arroz e feijão caiu 44% e 36%, respectivamente, a área de soja aumentou 161%, enquanto o milho aumentou 31% e a cana, 142%. Somados os três produtos, temos 72% da área agricultável do Brasil com apenas 3 culturas. São 57 milhões de hectares que ignoram a cultura alimentar e a diversidade nutricional do nosso país em favor de um modelo de monocultura, que só funciona com muito fertilizante químico, semente modificada e veneno, muito veneno.
No caso da cana e da soja, é fácil entender que não são alimentos, e sim mercadorias ou (commodities) que vão ser comercializadas nas bolsas de valores pelo mundo. No caso do milho, basta ver que em 2015 foram exportados 30 milhões de toneladas de milho, em relação direta com a alta do dólar. Com o preço da moeda americana em alta, vale mais à pena exportar do que vender aqui. Assim, o que sobra no Brasil não é suficiente para o nosso consumo, e por isso temos que importar, o que também irá pressionar o preço. Hoje é o feijão, logo logo será o milho que vai explodir de preço.
Outro aspecto importante é analisar que quem bota o feijão na mesa do povo é a agricultura familiar. Os dados ainda de 2006 mostram que 80% da área plantada de feijão (e 70% a produção) são da agricultura familiar. E esta agricultura não tem espaço no reino do agronegócio.
O agronegócio ameaça a soberania alimentar no Brasil. Ao deixar de plantar comida para plantar mercadorias, ficamos extremamente dependentes do mercado externo, e vulneráveis às mudanças climáticas.
O primeiro passo: reforma agrária para dar terra a quem quer plantar comida. Com a terra na mão, precisamos de incentivo à agroecologia, para produzir alimentos saudáveis. Finalmente, essa produção deve ser regulada pelo Estado, via Conab, para garantir o abastecimento interno antes de embarcar tudo para fora.
O governo interino já admite privatizar a Conab, e pode em breve aprovar leis que facilitam ainda mais o uso de agrotóxicos e o uso de pulverização aérea nas cidades.
É, de fato, também um Golpe Ruralista.